Liberte-se!

Este grito, "Liberte-se!" já foi dado incontáveis vezes na história, e parecia escrito que o advento da era digital e do software informático não poderia ser-lhe completamente imune.

Os primeiros computadores eram autómatos relativamente simples, de tal forma que era comum os próprios utilizadores, normalmente pessoas curiosas e ligadas ao mundo precedente da electrónica, desenvolverem os seus próprios programas nas horas livres. No entanto, a rápida evolução da tecnologia originou uma escalada vertiginosa das capacidades do hardware, ao mesmo tempo que os preços desciam, abrindo desta forma caminho a uma popularização dos sistemas informáticos.

Com a popularização abriram-se as portas a um novo ramo do comércio: o da informática. Em todo o mundo surgiram milhões de lojas de informática, a maior parte delas vocacionadas para o hardware - isto é, para a venda de computadores ou partes deles. Entretanto, o software (programas informáticos) não podia deixar de acompanhar a evolução. As empresas viram aqui uma oportunidade de negócio interessante, e rapidamente a aproveitaram. Os programas deixaram de ser pequenas linhas de código distribuídas com os computadores, e passaram a ser um produto independente, produzido e distribuído por empresas distintas das que comercializavam o hardware. A Microsoft é provavelmente o caso mais conhecido, dada a popularidade dos sistemas operativos Windows e da suite de escritório Microsoft Office, utilizados ainda na maioria dos computadores pessoais em todo o mundo.

Estes pioneiros da era do software souberam explorar bem a oportunidade única de que dispunham, e popularizaram os programas que comercializavam. Esta popularidade trouxe-lhes ainda outra vantagem sobre os seus concorrentes: um efeito de bola de neve interessante, já que quanto mais se generalizava a utilização dos seus programas, mais estes eram procurados por outras pessoas, levando rapidamente a um monopólio. Como forma de protecção deste mercado efervescente, as empresas produtoras adoptaram ainda outra estratégia: fechar o código dos seus programas. Enquanto que os primeiros programas eram distribuídos em formato «legível», estes passaram a ser distribuídos em ficheiros «executáveis», que apenas podem ser interpretados pelo computador. Ou seja, o cliente que compra não pode saber exactamente o que compra, mas tão somente que executa determinadas tarefas.

A situação manteve-se praticamente inalterada até ao aparecimento de um novo paradigma. Este veio a surgir no final da década de 1980. Richard Stallman, do laboratório de Inteligência Artificial do Massachusetts Institute of Technology, foi pioneiro da mudança, ao criar o conceito de Software Livre. Segundo este conceito, o utilizador deve poder conhecer o código dos programas que adquire, e mesmo alterá-lo e tornar públicas essas alterações, se assim o entender. As vantagens advenientes destas liberdades são imensas. Uma delas é que o cliente pode saber o que adquire (se o software for proprietário, é muito difícil saber tudo o que faz). Outra vantagem é que o cliente não fica refém de uma determinada empresa ou produto. A qualquer momento pode trocar para outro fornecedor de software, sem grandes problemas de compatibilidade (sendo o software aberto consegue-se, sem grande dificuldade, importar os dados para outro programa qualquer). Outra vantagem ainda é que as empresas produtoras não precisam de estar sempre a reinventar a roda: quando pretendem desenvolver um programa, podem aproveitar código já feito e disponibilizado por outra empresa cuja licença o permita. Desta forma consegue-se uma produtividade muito acima do que se consegue com o modelo de desenvolvimento de código fechado.

Este modelo de desenvolvimento de código aberto teve ainda uma consequência muito interessante: os programadores voltaram a partilhar livremente o código, como o faziam antigamente. Esta liberdade, aliada ao potencial de comunicação através da Internet, leva a que actualmente se encontre na rede software de elevada qualidade, e ainda por cima grande parte dele grátis. Algumas das melhores lojas na Internet, por exemplo, são geridas pelo software osCommerce, um programa grátis e da melhor qualidade, que permite a qualquer pessoa com conhecimentos médios de informática criar uma loja virtual em poucas horas. Outro exemplo é o Linux: um sistema operativo de qualidade comparável à do Windows, praticamente imune a vírus, grátis e bastante mais seguro. Outro exemplo ainda é o OpenOffice, uma suite comparável ao Microsoft Office, compatível com este, e que já permite a milhares de particulares e empresas poupar centenas de Euros por ano em licenças. Tudo isto vantagens de um modelo de desenvolvimento de software colaborativo, aberto, que está a fazer furor em vários países e agora também na Europa. Uma oportunidade a ter em conta especialmente para empresas que têm custos elevados de software, ou que usam software ilegal – libertem-se!

Jornal de Oliveira nº 113, 19 de Abril de 2007

 



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Inserido em: 2007-10-18 Última actualização: 2007-12-01

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