Fada com varinha de condão. Fada com varinha de condão.

Quem quer viver para sempre?

Viver para sempre tem sido um sonho que a Humanidade persegue desde longa data. Há séculos que feiticeiros, druidas e alquimistas procuravam o “elixir da eterna juventude” (e os poetas o cantavam e cantam, como fez Sérgio Godinho na memorável canção que vale sempre a pena ouvir de novo!).

Mas enquanto o desejado elixir não aparece, os mais afoitos (ou ousados?) vão comendo goji berries, ricas em anti-oxidantes que anulam os radicais livres que oxidam as células. Ou bebendo água alcalina para anular a acidez do organismo. Ou encharcando-se de pílulas para isto e para aquilo, umas coisas fundamentadas outras nem por isso, que viver para sempre não é tarefa fácil e a ciência (quando a há) nisto lida inevitavelmente com informação incompleta. Ah!, e não esquecer os que, honra lhes seja feita, simplesmente seguem um estilo de vida natural e saudável, com alimentação regrada, exercício físico, procura de ambientes naturais e não poluídos, sem stress, mantendo hábitos que certamente não só prolongam a vida como lhe aumentam a qualidade.

No entanto, viver para sempre parece poder ser concretizado com base numa de três hipóteses distintas: 1) Hipótese mística; 2) Hipótese biológica; 3) Hipótese tecnológica.

A hipótese mística é inelutavelmente uma questão de fé, portanto pessoal.

A hipótese biológica tem sido pouco explorada, mas ninguém em bom rigor científico pode descartá-la completamente. Aubrey de Grey [1] é um dos grandes protagonistas desta hipótese. Segundo Aubrey, o envelhecimento é essencialmente uma doença. Portanto, como todas as doenças, pode ser curada. A causa? Efeitos secundários do metabolismo. Por outras palavras, o metabolismo do corpo humano, sendo necessário como suporte à vida, tem efeitos secundários que acabam por encurtá-la: mutações celulares que degeneram em cancro; mutações mitocondriais indesejadas (mitocôndria é a parte da célula responsável pela geração de energia); lixo intra-celular (moléculas não digeridas pela célula); lixo extra-celular (moléculas acumuladas fora das células); perda de células que não são substituídas pelo organismo; senescência celular (i.e., células que deixam de conseguir dividir-se); e excesso de ligações químicas entre as células, que acabam por causar rigidez dos tecidos. Estes processos são causa do envelhecimento do corpo humano, tendo como consequência a sua progressiva debilitação e como fim a sua morte natural. O remédio? Neutralizar cada um destes efeitos! Alguns a ciência já provou que pode ser possível conseguir. Mas os resultados práticos são poucos e há ainda, sem dúvida, um caminho longo a percorrer!

A hipótese tecnológica é radicalmente diferente: construir uma máquina inteligente e transferir para esta aquilo que “somos”. Bem, isto é muito mais fácil de escrever do que de fazer! Há aqui três problemas fundamentais: 1) Saber “o que somos”; 2) Construir uma máquina que “nos suporte”; 3) Saber como “transferir-nos”. O terceiro problema que não nos tire por enquanto o sono. Afinal, o primeiro e o segundo são complicados de sobra. Neurologistas, anatomistas, médicos, biólogos, vão procurando responder ao primeiro problema. Mas enquanto a resposta não chega, engenheiros vão jogando em dois campos diferentes: tentando absorver o que se descobre nas áreas da biologia e anatomia, ao mesmo tempo que tentam simulá-lo utilizando matéria inorgânica (em máquinas, entenda-se). E, interessante também, as descobertas tecnológicas vão provando, refutando ou lançando novas hipóteses para o campo biológico. Em breve, quem sabe, teremos uma máquina capaz de simular um cérebro humano. Depois é “só” fazer uma cópia do humano para a máquina, e eis uma máquina que pensa e age como um homem – uma réplica, se assim lhe podemos chamar. Além disso, “quem faz uma faz um cento”, pelo que há-de ser possível substituir qualquer peça da máquina, levando a que o desgaste não seja um problema. E eis então a chave da imortalidade por via da resposta tecnológica!

Quão longe estamos disto? Ninguém poderá dizer com certeza. A hipótese biológica nem sequer é ainda levada a sério por toda a comunidade científica. A hipótese tecnológica é uma abordagem completamente diferente da nossa natureza, e nem sequer ainda somos capazes de construir máquinas consideradas de grande inteligência, quanto mais de simular um cérebro humano! A hipótese mística, como se disse, é uma questão de fé e não tem base científica. Também pode, claro, ser uma questão de sorte: nunca se sabe quando aparece por aí uma fada ou um génio a conceder desejos. Pelo sim, pelo não, especialmente em tempo de crise pode ser boa ideia começar a esfregar as lâmpadas velhas...


[1] http://en.wikipedia.org/wiki/Aubrey_de_Grey



Este artigo pode ser reproduzido total ou parcialmente, desde que seja referido o endereço: http://www.tecnociencia.etikweb.com/Article-35-Quem-quer-viver-para-sempre-.html

Inserido em: 2008-10-17 Última actualização: 2008-10-17

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